O
Dr. Arun Gandhi, neto de Mahatma Gandhi e fundador do MK Institute, contou a
seguinte história sobre a vida sem violência, na forma da habilidade de seus
pais, em uma palestra proferida em junho de 2002 na Universidade de Porto Rico.
Eu
tinha 16 anos e vivia com meus pais, na instituição que meu avô havia fundado,
e que ficava a 18 milhas da cidade de Durban, na África do Sul.
Vivíamos
no interior, em meio aos canaviais, e não tínhamos vizinhos; por isso minhas
irmãs e eu sempre ficávamos entusiasmados com possibilidade de ir até a cidade
para visitar os amigos ou ir ao cinema.
Certo
dia meu pai me pediu que o levasse até a cidade, onde participaria de uma
conferência durante o dia todo. Eu fiquei radiante com esta oportunidade.
Como
íamos até a cidade, minha mãe me deu uma lista de coisas que precisava do
supermercado e, como passaríamos o dia todo, meu pai me pediu que tratasse de
alguns assuntos pendentes, como levar o carro à oficina.
Quando
me despedi de meu pai ele me disse: "Nós nos encontraremos aqui, às 17
horas, e voltaremos para casa juntos."
Depois
de cumprir todas as tarefas, fui até o cinema mais próximo. Distraí-me tanto
com o filme (um filme duplo de John Wayne) que esqueci da hora. Quando me dei
conta eram 17h30.
Corri
até a oficina, peguei o carro e apressei-me a buscar meu pai.
Eram
quase 18 horas. Ele me perguntou ansioso: "Por que chegou tão tarde?"
Eu
me sentia mal pelo ocorrido, e não tive coragem de dizer que estava vendo um
filme de John Wayne. Então, lhe disse que o carro não ficara pronto, e que
tivera que esperar.
O
que eu não sabia era que ele já havia telefonado para a oficina. Ao perceber
que eu estava mentindo, me disse: "Algo não está certo no modo como o
tenho criado, porque você não teve a coragem de me dizer a verdade. Vou
refletir sobre o que fiz de errado a você. Caminharei as 18 milhas até nossa
casa para pensar sobre isso." Assim, vestido em suas melhores roupas e
calçando sapatos elegantes, começou a caminhar para casa pela estrada de terra
sem iluminação.
Não
pude deixá-lo sozinho... Guiei por 5 horas e meia atrás dele...
Vendo
meu pai sofrer por causa de uma mentira estúpida que eu havia dito.
Decidi
ali mesmo que nunca mais mentiria.
Muitas
vezes me lembro deste episódio e penso: "Se ele tivesse me castigado da
maneira como nós castigamos nossos filhos, será que teria aprendido a
lição?" Não, não creio. Teria sofrido o castigo e continuaria fazendo o
mesmo. Mas esta ação não-violenta foi tão forte que ficou impressa na memória
como se fosse ontem.